14 de jul. de 2014

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          Já passava das nove horas, Eva abriu os olhos e  tentou ouvir algo, mas o silêncio era ensurdecedor . Levantou-se e, lentamente, andou pela casa. De repente, aquela solidão tão rotineira a qual ela estava tão habituada e até gostava, feriu-lhe a alma. Atirou-se no sofá que comprara de segunda mão e ali permaneceu por horas, olhar perdido e pensamentos confusos. Recordou-se de um sonho que teve noite passada, aliás, recordou-se de todos os sonhos que teve a vida inteira e que se perderam pelo caminho. A solidão que lhe fazia companhia todos os dias, pela primeira vez, a fez pensar: "Quem sou eu agora?", pensou também em quem foi. Mas isso não importa mais, ali estava e não havia como retroceder.
        Sacudiu a cabeça como se querendo espantar os maus pensamentos e lembrou que tinha que alimentar os cães e que seu marido e filhos chegariam ao final da tarde e tudo deveria estar em ordem. De alguma maneira lhe fazia bem pensar nisso, sentia-se útil e necessária. Assim, na companhia de sua amiga solidão, espantou a preguiça e seguiu sua rotina diária de boa mãe e boa esposa. Mas por algum motivo não conseguia parar de pensar no que havia sentido naquela manhã. Pensou em conversar com alguém, mas não era pessoa de muitos amigos, não para esse tipo de conversa. Sentiu então, saudade de sua avó que agora morava no céu, que sempre tinha um bom conselho para dar e que vivia falando "ditados", como ela mesmo intitulava suas frases. -Minha avozinha amada...- Pensou Eva, sorrindo.
           Eva, pessoa de aparência despreocupada, de bom coração, sempre pronta a ajudar quem fosse, amava os filhos e o marido de tal forma que isso era suficiente para deixá-la feliz, mas vivia agora um conflito interior, quase uma crise de identidade que ela tentava inutilmente afastar de seus pensamentos. Nunca parava para pensar no futuro e nem era pessoa de remoer o passado, vivia o presente como tinha que ser. Boa observadora, dificilmente algo lhe passava desapercebido e sempre tinha uma opinião sobre os acontecimentos, mas quando o assunto tornou-se sua própria vida, Eva não sabia o que fazer.

           

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